DA JORNADA DE TRABALHO
A escala contratual de trabalho era de 6x2 em turnos
ininterruptos de revezamento, alternando-os a cada seis dias trabalhados (doc.
juntado).
A escala contratual era conforme abaixo:
1º Turno:
06h00’ às 14h00’
2º Turno:
14h00’ às 22h00’
3º Turno:
22h00’ às 06h00’
Entretanto, em que pese se tratar de turnos ininterruptos
de revezamento, o que consabidamente é prejudicial à saúde do trabalhador, o
certo é que a jornada contratual era diuturnamente extrapolada.
Sabe-se que o trabalho em turno é aquele em que
grupos de trabalhadores se sucedem no mesmo local de trabalho, cumprindo
horários que permitam o funcionamento ininterrupto da empresa.
Desta forma, considera-se que um trabalhador desenvolve
suas atividades em turnos ininterruptos de revezamento quando sua jornada de
trabalho abrange o dia e noite, ou seja, devido à escala de serviço, ora é realizada
na parte da manhã, ora na parte da tarde e ora na parte da noite.
Como se pode perceber a configuração dos turnos
ininterruptos de revezamento tem haver tanto com a forma de serviço da empresa,
que deve ser ininterrupta, quanto com a jornada de serviço do empregado, que
deve abranger tanto o dia, quanto a noite, amoldando-se tais situações
perfeitamente neste caso concreto.
Ademais, para os empregados que se sujeitam a este
regime de revezamento, a duração da jornada está limitada a 06 horas diárias,
conforme previsão Constitucional no artigo 7º, inciso XIV:
Constituição Federal
XIV - jornada de seis horas para o trabalho
realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
Ocorre que, na prática o reclamante cumpria com
habitualidade jornada de trabalho superior ao limite diário de seis horas, na
seguinte proporção:
Entre os seis dias laborados, em média três a jornada
se estendia por 12h00min e nos outros três cumpria a carga de 08h00min diárias,
resultando, no período citado.
O reclamante em média trabalhava em quatro dias
destinados à sua folga por mês, desvirtuando ainda mais os turnos ininterruptos
de julgamento.
Em face do não cumprimento pela empresa dos requisitos
do art. 7º, XIV, da Constituição Federal de 1988 pede-se a nulidade de qualquer
acordo individual ou coletivo que tenha instituído período maior para os turnos
interruptos de revezamento.
Resta
a discussão, portanto, com relação à validade dos turnos ininterruptos de
revezamento de 8 horas ao qual impiedosamente os trabalhadores da ré são submetidos.
Sabe-se
que o trabalho em turnos ininterruptos de revezamento é muito desgastante para
o empregado, pois o ritmo circadiano, correspondente ao relógio biológico do
ser humano, que controla variações de temperatura, segregação de hormônios,
digestão, sono, é alterado constantemente, tratando-se, portanto, de um
trabalho penoso.
Assim,
o intuito foi o de diminuir a jornada para o trabalho realizado nos referidos
turnos, pelo maior desgaste que causa ao empregado, e não o de favorecer a
atividade produtiva do empregador.
É
enganosa a interpretação isolada dada ao inciso XIV, do art. 7º, da
Constituição Federal de 1988.
XIV - jornada de seis horas para o trabalho
realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
A
expressão “salvo negociação coletiva” não pode ser interpretada isoladamente e
de forma destacada do universo jurídico em que se insere, deve de início respeitar
a unidade da Constituição e os seus Princípios.
Como
se sabe, o sistema jurídico é interpretável a partir da ideia de sistema
hierarquicamente organizado, no qual se tem no topo da hierarquia a
Constituição Federal.
Com
efeito, a interpretação está ligada diretamente a noção de sistema jurídico. Na
verdade, é de noção de sistema que depende grandemente o sucesso do ato interpretativo.
A maneira pela qual o sistema jurídico é encarado, suas qualidades, suas
características, são fundamentais para a elaboração do trabalho de
interpretação.
No
sistema jurídico os elementos são as normas jurídicas, e sua estrutura é
formada pela hierarquia, pela coesão e pela unidade.
A
hierarquia vai permitir que a norma jurídica fundamental (Constituição Federal)
determine a validade de todas as demais normas jurídicas de hierarquia inferior.
A
coesão demonstra a união íntima dos elementos (princípios e normas jurídicas)
como o todo (o sistema jurídico), apontando, por exemplo, para ampla harmonia e
importando em coerência.
A
unidade dá um fechamento ao sistema jurídico como um todo que não pode ser
dividido: qualquer elemento interno (princípio ou norma jurídica) é sempre
conhecido por referência ao todo unitário (o sistema jurídico).
Feitas
estas observações de ordem hermenêutica chegamos à conclusão de que não se pode
interpretar o inciso XIV, do art. 7º da Constituição Federal de 1988 de forma
gramatical, isolada e totalmente dissociada do universo jurídico a que se
insere.
Para
sua correta interpretação há que no mínimo colocá-la em consonância com o
contido no “caput” do artigo e não em confronto e antagonismo. Vejamos:
Art. 7º. São direitos dos trabalhadores
urbanos e rurais, além de outros que
visem à melhoria de sua condição social:
XIV - jornada de seis horas para o trabalho
realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
A
única leitura possível que pode ser feita através de uma interpretação jurídica
segundo a Constituição é de que o “salvo
negociação coletiva” deve estar em perfeita sintonia com “além de outros que visem à melhoria de sua
condição social”.
Portanto,
quando o legislador afirma que para o trabalho realizado em turnos
ininterruptos de revezamento a jornada máxima diária é de seis horas, salvo
negociação coletiva, este negociação coletiva tem de ser entendido sempre no
sentido de melhoria da condição social do trabalhador e não ao contrário.
A
autonomia coletiva dos particulares neste caso somente poderia ser exercida
para a melhoria da condição social, ou seja, para fixação de uma jornada mais
benéfica e não em detrimento do trabalhador.
A
razão ontológica do poder constituinte originário elevar a nível constitucional
a redução de jornada em turnos ininterruptos de revezamento para seis horas são
os malefícios provocados pela alternância de horários no fisiologismo humano.
Em
sendo assim, a negociação coletiva é para melhorar a condição social do
trabalhador, ou seja, no presente caso para produzir jornadas ainda menores ou
compensações para saúde e segurança do trabalhador, e não para pura e
simplesmente atender a uma melhor dinâmica do empregador.
Por
essa razão é que a Constituição, sabiamente, arrolou como direito dos
trabalhadores a "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de
normas de saúde, higiene e segurança" (art. 7º, XXII).
Pela
mesma razão é que a ação administrativa estatal, através de normas de saúde
pública e de medicina e segurança do trabalho que venham reduzir o tempo lícito
de exposição do trabalhador a certos ambientes ou atividades não é inválida - nem
ilegal, nem inconstitucional. Ao contrário, é francamente autorizada (mais:
determinada) pela Constituição, através de inúmeros dispositivos que se
harmonizam organicamente.
Citem-se,
por exemplo, o mencionado art. 7º, XXII, que se refere ao direito à redução dos
riscos do trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança; o art.
194, caput, que menciona a seguridade social como um "conjunto
integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade,
destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde..."; o art. 196, que
coloca a saúde como "direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de
outros agravos..."; o art. 197, que qualifica como de "relevância pública
as ações e serviços de saúde..."; cite-se, finalmente, o art. 200, II, que
informa competir ao sistema único de saúde "executar as ações de
vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador".
Por
fim, há que se ponderar que os Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho que
dilataram a jornada de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento ferem o
Pacto de São José da Costa Rica, o qual visa dentre outras coisas a melhoria das
condições de trabalho, de renda e prevenção de riscos.
Admitir
o contrário em um fraquíssimo modelo sindical como o brasileiro, marcado por
sindicalismo por categorias, unicidade sindical, imposto sindical obrigatório,
perpetuação do poder em mãos de poucos dirigentes é invalidar todo o arcabouço
protetivo e de melhoria continuada das condições de trabalho.
Para
haver um acréscimo na jornada em turnos ininterruptos de revezamento no mínimo
deveria ser negociada uma compensação pelos malefícios causados.
Por
analogia ao § 3º do art. 71 da Consolidação das Leis do Trabalho, pode se
concluir que uma violação ao Acordo ou Convenção coletiva desnatura a avença
entabulada pela autonomia coletiva dos particulares. Da mesma forma a atividade
era perigosa e insalubre.
No
mais será que a saúde, o convívio social e familiar podem ser “compensados”
monetariamente.
Portanto,
de todos os ângulos que se olha não é possível se emprestar validade aos
Acordos e Convenções Coletivas que determinaram o aumento da carga horária em turnos
ininterruptos de revezamento, pedindo-se, pois mais uma vez sua nulidade e para
se considerar extraordinárias as que extrapolarem a 6ª diária de 36ª semanal.
Por
extremo apego ao argumento, caso assim não entenda o Juízo, ainda sim a ré não
quitou corretamente as horas extras que ultrapassaram a 8ª hora diária.
Isto
Posto, pede-se novamente que a ré seja condenada a pagar horas extras a partir
da 6ª diária e 36ª semanal, entretanto, se assim não entender, a título de
pedido sucessivo, comprova-se que há diferenças a serem pagas de horas extras,
devendo ser condenada em seu pagamento, bem como refleti-las (pagas e impagas)
nos DSR’s, 13o salário, férias com 1/3, FGTS + 40%.